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15 de março de 2012

Ninguém deixa de ter uma filosofia

"Ninguém deixa de ter uma filosofia. Quem se gaba de não ter filosofia, está sendo vítima da filosofia que esconde atrás dessa negação. A estrita separação entre homem e o mundo não é natural, nem original. Esta separação originou-se de uma filosofia. Foi Descartes que, com alguns outros, em obras de natureza filosófica, cavou um fosso entre o homem e o mundo, entre assuntos humanos e não-humanos e entre a res-cogitantes e a res-extensae, nas palavras de Descartes. Desde então, esta separação lançou raízes, avantajando a ciência física, pois, esta é impotente em relação aos objetos inumanos. É fácil compreender que uma ciência como a psicologia tem sido prejudicada por esta separação. Por causa disso a psicologia tornou-se a ciência do sujeito, o que significa, em última análise, a ciência de um vácuo, de um nada: pois o sujeito, o sujeito puro, o homem interior sem nenhuma coisa exterior, não existe. Cada um de nós pode confirmar este fato, examinando se eventos puramente subjetivos ocorrem alguma vez conosco. Ao pensarmos, pensamos alguma coisa, localizada, em última análise, aí, acolá, lá fora, ou seja, uma coisa, ou algo relacionado com coisas. Ao sentir, sentimos simpatia para com pessoas e coisas, aí fora, sente-se ausência, a falta de alguma coisa, a ausência de algo aí fora, exterior à nossa própria pessoa. Mesmo a imaginação mais individual e abstrata pinta alguma coisa, aí, externa: uma fantasia, um castelo de Espanha, uma utopia ou o reino dos bem-aventurados: coisas impossíveis de discernir pelo toque das mãos, mas assim mesmo imaginadas entre, ao lado ou em cima de outras coisas que se podem tocar. Nada nos pertence que não seja ligado a algo externo. Isto torna sem sentido qualquer psicologia estritamente subjetiva. Não existe tal psicologia."


in O paciente Psiquiátrico. J.H.van den Berg.

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